STANISLAV GROF E A PSICOLOGIA DO FUTURO



Stanislav Grof, PhD

Stanislav GrofM.D., Ph.D., é um psiquiatra com mais de 60 anos de experiência em pesquisa de estados não ordinários de consciência e um dos fundadores e principais teóricos da psicologia transpessoal. Grof nasceu em Praga, na então Tchecoslováquia, onde concluiu a sua formação científica, recebendo os títulos de M.D. pela Escola de Medicina da Universidade Carolina (Charles University) em Praga, e de Ph.D. em medicina pela Academia de Ciências da Tchecoslováquia. Ele também recebeu doutoramentos Honoris Causa da Universidade de Vermont em Burlington, Vermont, do Instituto de Psicologia Transpessoal em Palo Alto, Califórnia, e da World Buddhist University em Bangkok, Tailândia. Em 2018, Stanislav Grof recebeu o título de Doutor Honoris Causa em Terapia Psicodélica e Artes de Cura do Instituto de Estudos Integrais da Califórnia (CIIS – California Institute of Integral Studies) em São Francisco.

Stanislav Grof conduziu as suas primeiras pesquisas no Instituto de Pesquisa Psiquiátrica em Praga, onde foi o principal investigador de um programa que explorava sistematicamente o potencial heurístico e terapêutico do LSD e de outras substâncias psicodélicas. Em 1967, ele recebeu uma bolsa do Fundo de Fundações para Pesquisa em Psiquiatria em New Haven, Connecticut, e foi convidado a atuar como clínico e pesquisador na Universidade Johns Hopkins e na unidade de pesquisa do Hospital Spring Grove em Baltimore, Maryland.

Em 1969, ele se tornou professor assistente de psiquiatria na Johns Hopkins University e continuou sua pesquisa como chefe de pesquisa psiquiátrica no Centro de Pesquisa Psiquiátrica de Maryland em Catonsville, Maryland. Em 1973, ele foi convidado como acadêmico residente para o Instituto Esalen em Big Sur, Califórnia, onde desenvolveu com Christina, sua falecida esposa, a respiração holotrópica, uma forma inovadora de psicoterapia experiencial que atualmente está sendo utilizada em todo o mundo.

Dr. Grof é o fundador da Associação Transpessoal Internacional (ITA – International Transpersonal Association), a qual presidiu por várias décadas. Em 1993, ele recebeu um prêmio honorário da Associação para Psicologia Transpessoal (ATP – Association for Transpersonal Psychology) por suas grandes contribuições para o desenvolvimento do campo da psicologia transpessoal, durante a Convocação do 25º Aniversário realizada em Asilomar, Califórnia. Em 2007, ele recebeu o prestigioso prêmio Visão 97, pelo conjunto de sua obra, da Fundação de Dagmar e Václav Havel em Praga. Em 2010, ele recebeu o prêmio Thomas R. Verny da Association for Pre- and Perinatal Psychology and Health (APPPAH) por suas contribuições essenciais para o campo. Ele também foi convidado como consultor para efeitos especiais para os filmes de ficção científica Brainstorm (MGM) e Millenium (20th Century Fox).

O Dr. Grof já publicou mais de 160 artigos em revistas científicas, além de muitos livros, incluindo Realms of the Human Unconscious, republicado como LSD: Gateway to the Numinous (2009); Além do cérebro (1985); LSD Psychotherapy (1978); O jogo cósmico (1990); Psicologia de o futuro (2000); The Ultimate Journey (2006); Quando o impossível acontece (2006); Books of the Dead (1994); Cura profunda (2012); Uma compreensão da arte à luz da pesquisa moderna da consciência (2015); The Call of the Jaguar (2002); Beyond Death (1980); A tempestuosa busca do ser (1990); Emergência espiritual (1989); e Respiração Holotrópica (2010) (os últimos quatro com Christina Grof).

Esses livros foram traduzidos para 22 línguas, incluindo alemão, francês, italiano, espanhol, português, holandês, sueco, dinamarquês, russo, ucraniano, esloveno, romeno, tcheco, polonês, búlgaro, húngaro, letão, grego, turco, coreano, japonês e chinês.

Desde abril de 2016, ele tem um casamento feliz com Brigitte Grof. Eles vivem na Alemanha e na Califórnia e viajam juntos para mundos internos e externos, conduzindo seminários e workshops de Respiração Holotrópica em todo o mundo.

Em agosto de 2019, foi publicada a sua obra enciclopédica, O caminho do psiconauta, e foi lançado o filme documentário sobre a sua vida e obra: The Way of the Psychonaut – Stan Grof and the journey of consciousness.

Em maio de 2020, ele criou, juntamente com sua esposa, Brigitte Grof, seu novo treinamento para trabalho com estados holotrópicos de consciência: o Grof® Legacy Training internacional (www.grof-legacy-training.com).

Seu site é www.stanislavgrof.com.

STANISLAV GROF E A PSICOLOGIA DO FUTURO

Stanislav Grof

Por Alexandre Pedrassoli

“O que havia começado como uma sondagem psicológica da psique inconsciente tornou-se automaticamente busca filosófica do significado da vida e jornada de descoberta espiritual.” — S. Grof, “Psicologia do Futuro”
“A imagem do cosmo como uma supermáquina gigante com características newtonianas, consistindo em blocos de construção separados (partículas elementares e objetos), deu lugar a uma visão de campo unificado, um todo orgânico no qual tudo está significativamente interligado.” — S. Grof, “Quando o Impossível Acontece”
“O trabalho com estados holotrópicos nos mostra uma alternativa radical e surpreendente: a mobilização da inteligência interna profunda dos clientes, que guia o processo de cura e transformação.” — S. Grof, “Quando o Impossível Acontece”

Biografia

Stanislav Grof nasceu em Praga, na antiga Tchecoslováquia, em 1 de julho de 1931. É um dos pioneiros da Psicologia Transpessoal, e um estudioso dos estados ampliados de consciência, sejam eles espontâneos ou induzidos por diversas técnicas. Entre as técnicas possíveis, Grof estudou especialmente as drogas psicodélicas, como o LSD, e as técnicas respiratórias. Depois de muitos anos de pesquisa, desenvolveu sua própria técnica: a Respiração Holotrópica, que combina um tipo específico de respiração, músicas, trabalho corporal e artístico, para fins terapêuticos e de autoconhecimento.
As descobertas de Stanislav Grof só foram possíveis devido a uma descoberta que havia sido feita em 1943. Em abril desse ano, um químico da indústria farmacêutica Sandoz acidentalmente intoxicou-se com uma substância que havia sintetizado pela primeira vez cinco anos antes, a partir de um fungo comumente encontrado nos campos de centeio. Ele teve então que interromper seu trabalho, pois foi tomado de ansiedade e tonturas, seguidas de um estado semelhante a um sonho, em que presenciou uma sequência incrível de imagens e de desenhos abstratos coloridos, durante cerca de duas horas.
Esse químico chamava-se Albert Hofmann e a substância era a dietilamida do ácido lisérgico, ou LSD. Dez anos depois desse incidente, a Universidade Karlova, em Praga, recebia amostras de LSD para fins de pesquisa. A Sandoz dizia que a droga parecia provocar uma psicose temporária, e que portanto seria uma ferramenta útil no estudo das psicoses, entre outras possibilidades.
Nessa época, Stanislav Grof era estudante de medicina nessa universidade, e interessou-se em acompanhar sessões em que voluntários eram submetidos a observação após ingerirem LSD. O interesse de Grof nesse tempo girava em torno da psicanálise freudiana.
Em 1956, após sua graduação em medicina, Grof submeteu-se pessoalmente à sua primeira sessão com LSD. A experiência que teve, de alargamento da percepção, do contato com emoções ocultas, e as sensações de integração com o universo, foram tão intensas e pessoalmente transformadoras, que seu interesse pela psicanálise freudiana foi imediatamente obscurecido e Grof decidiu então se dedicar ao estudo dos estados ampliados de consciência.
De 1960 a 1967, Grof trabalhou no Departamento para o Estudo de Relações Interpessoais, no Instituto de Pesquisas Psiquiátricas em Praga. pesquisando o potencial terapêutico das substâncias psicodélicas. Nessa época, apenas a Suíça e a Tchecoslováquia produziam oficialmente LSD. Em março de 1967, Grof e seu irmão Paul deixam a Tchecoslováquia e vão tentar a vida na América do norte: Grof nos EUA e Paul no Canadá. Grof é convidado a trabalhar na Universidade John Hopkins, como médico e pesquisador. Nesse final da década de 1960 até o início da década de 1970, Grof estuda o efeito dos psicodélicos em pacientes com câncer terminal.
Em 1973, Grof é convidado a mudar-se para Big Sur, na Califórnia, para trabalhar noInstituto Esalen. Lá, ministra palestras e cursos, e continua suas pesquisas com psicodélicos. Entretanto, o LSD havia sido proibido nos EUA no mesmo ano em que Grof chegou a esse país, e foi ficando cada vez mais difícil conseguir a droga. Em 1975, ele conhece Christina, sua futura esposa, com quem passa a trabalhar em Esalen. Juntos, desenvolvem a Respiração Holotrópica, uma técnica que combina respiração, músicas, trabalho corporal e artístico, para induzir um estado de consciência semelhante àquele criado pelo consumo de LSD.
O termo “holotrópico” foi criado por Grof e significa aproximadamente “em direção ao todo”, em oposição a “hilotrópico” (”em direção às partes”), nosso estado comum de vigília. Grof afirma que no estado holotrópico, a pessoa tende a perceber o todo mais do que as partes. Ela pode então compreender as interconexões entre fatos, pessoas, sentimentos, e a partir dessa compreensão, consegue transformar positivamente sua vida.
Em 1977, Grof publica seu primeiro livro, chamado “Realms of the Human Unconscious: Observations from LSD Research” (sem tradução para o português), onde apresenta suas conclusões baseadas na observação de milhares de sessões de LSD, coletadas durante duas décadas. Nesse mesmo ano, funda a ITA – International Transpersonal Association. Em 1987, Grof deixa Esalen e passa a dedicar-se principalmente a divulgação de sua teoria e da Respiração Holotrópica. Em 1989, publica “Spiritual Emergency” (”Emergência Espiritual”), onde analisa casos em que pessoas entram espontaneamente em estados holotrópicos, como um processo natural de transformação pessoal.
No ano 2000, publicou “Psicologia do Futuro”, onde apresenta sua visão do que seria uma psicologia mais completa e mais profunda, tanto para fins terapêuticos como de autoconhecimento. Suas conclusões para esse livro foram baseadas em mais de 30 mil sessões conduzidas ou supervisionadas por ele.
Stanislav Grof atua atualmente como professor de Psicologia no California Institute for Integral Studies, em São Francisco e na Pacifica Graduate School, em Santa Barbara. Conduz seminários e palestras no mundo todo.

Principais influenciadores

  • Sigmund Freud (1856-1939), neurologista austríaco
  • Carl Gustav Jung (1875-1961), psiquiatra suíço
  • Abraham Maslow (1908-1970), psicólogo americano

Linha do Tempo

1931
No dia 1 de julho, nasce Stanislav Grof, em Praga, capital da antiga Tchecoslováquia
1956
Gradua-se em medicina pela Universidade Karlova, em Praga. Após a formatura, submete-se como voluntário, à sua primeira sessão com uso de LSD.
1960-1967
Grof trabalha do Departamento de Estudos de Relações Interpessoais, no Instituto de Pesquisas Psiquiátricas em Praga, pesquisando potencial terapêutico dos psicodélicos.
1967
Grof e seu irmão Paul saem da Tchecoslováquia. Grof muda-se para os Estados Unidos e é convidado a trabalhar na Universidade John Hopkins, como médico e pesquisador.
fim anos 60 – início anos 70
Grof conduz pesquisas com uso de psicodélicos em pacientes com câncer terminal
1972
Participa da Primeira Conferência Transpessoal Internacional, na Islândia. Durante o evento, casa-se com Joan Halifax.
1973
Grof muda-se para Big Sur, na Califórnia. Passa a ministrar palestras e conduzir pesquisas no Instituto Esalen.
1975
Grof conhece Christina e passam a trabalhar e morar juntos em Esalen. Começam a trabalhar com a Respiração Holotrópica.
1977
Grof publica seu primeiro livro: “Realms of the Human Unconscious: Observations from LSD Research” (sem tradução para o português)
1977
Grof funda a ITA – International Transpersonal Association (Associação Transpessoal Internacional)
1978
Grof e Christina participam da Quarta Conferência Transpessoal Internacional, em Belo Horizonte, Brasil
1985
Publica “Beyond the Brain”, primeiro livro de Grof a ser traduzido para português, em 1988, com o título “Além do Cérebro: Nascimento, Morte e Transcendência em Psicoterapia”
1987
Grof deixa Esalen
1992
Grof realiza Conferência da ITA em Praga, depois de mais de 20 anos morando fora de seu país natal
1993
Recebe Prêmio Honorário da Associação para Psicologia Transpessoal (Association for Transpersonal Psychology)
2006
Publica “When the Impossible Happens” (”Quando o impossível acontece”, Heresis, 2007), onde relata pela primeira vez suas próprias experiências transpessoais

Livros de Stanislav Grof

(o ano indicado refere-se à primeira edição da obra)
  • Realms of the Human Unconscious: Observations from LSD Research. Viking Press, 1975.
  • The Human Encounter with Death. E. P. Dutton, 1977.
  • Beyond Death: Gates of Consciousness. (Além da Morte: Mitos, Deuses, Mistérios). Thames and Hudson, 1980.
  • LSD Psychotherapy. Hunter House, 1980.
  • Ancient Wisdom and Modern Science. SUNY Press, 1984.
  • Beyond the Brain: Birth, Death, and Transcendence in Psychotherapy. (Além do Cérebro: Nascimento, Morte e Transcendência em Psicoterapia). SUNY Press, 1985.
  • The Adventure of Self-Discovery. (A aventura da autodescoberta). SUNY Press, 1987.
  • Human Survival and Consciousness Evolution. SUNY Press, 1988.
  • Spiritual Emergency: When Personal Transformation Becomes a Crisis. (Emergência Espiritual: Crise e Transformação Espiritual). J. P. Tarcher, 1989.
  • The Stormy Search for the Self: a Guide to Personal Growth Through Transformational Crisis. (A tempestuosa busca do ser). J. P. Tarcher, 1990.
  • The Holotropic Mind: the Three Levels of Consciousness and How They Shape Our Lives. (A Mente Holotrópica: Novos Conhecimentos Sobre Psicologia e Pesquisa da Consciência). Harper Collins, 1992.
  • The Books of the Dead: Manuals for Living and Dying. Thames and Hudson, 1994.
  • The Cosmic Game: Explorations of the Frontiers of Human Consciousness. (O Jogo Cósmico: Explorações das Fronteiras da Consciência Humana). SUNY Press, 1998.
  • The Consciousness Revolution: a Transatlantic Dialogue. Element Books, 1999.
  • Psychology of the Future: Lessons from Modern Consciousness Research. (Psicologia do Futuro: Lições das Pesquisas Modernas da Consciência). SUNY Press, 2000.
  • The Ultimate Journey: Consciousness and The Mystery of Death. MAPS, 2006.
  • When the Impossible Happens: Adventures in Non-Ordinary Realities. (Quando o impossível acontece: histórias extraordinárias que desafiam a ciência).Sounds True, 2006.

Links Relacionados

Associação de Psicologia Transpessoal (Association for Transpersonal Psychology)
Revista de Psicologia Transpessoal (Journal of Transpersonal Psychology)

Referências Bibliográficas

GROF, Stanislav; GROF, Christina. Emergência Espiritual. São Paulo: Cultrix, 1989.
GROF, Stanislav. Psicologia do futuro. São Paulo: Heresis, 2000.
GROF, Stanislav. Quando o impossível acontece. São Paulo: Heresis, 2007.

Artigos Relacionados



O MODELO DA CARTOGRAFIA DA CONSCIÊNCIA DE STANISLAV GROF




Artigo publicado pelo Conselho de Psicologia de São Paulo (CRP-SP), parte da coleção Psicologia, Laicidade e as Relações com Religião e Espiritualidade


Ligia Splendore – Psicóloga, especialista em Transpessoal, CRP 28224-6, ALUBRAT, São Paulo-Brasil, ligiasplendore@gmail.com

Sean Blackwell – Sociólogo, Toronto-Canada, seaninsp@gmail.com


Ementa

Um aspecto comum a diversas práticas não hegemônicas é a visão de homem bio-psico-sócio-espiritual, no entanto, faz-se necessário mais estudos que fundamentem tal visão.


Apresentação

A cartografia da consciência proposta por Stanislav Grof traz uma epistemologia que sustenta a visão multidimensional do ser humano com base na fenomenologia dos estados holotrópicos de consciência. Pioneiro nos estudos dos estados não ordinários de consciência na década de 60 e com mais de 50 anos de experiência clínica, Grof defende que a dimensão espiritual é inerente ao ser humano e que só um novo modelo psicológico que integre essa perspectiva poderá fazer jus a real complexidade e a amplitude da subjetividade humana.


Texto Principal

O psiquiatra tcheco Stanislav Grof iniciou suas pesquisas dos estados não ordinários de consciência acompanhando milhares de pacientes em Praga e nos Estados Unidos em utilização do LSD (dietilamida do ácido lisérgico), uma das substâncias alucinógenas mais difundidas, indicada na época para tratamento psiquiátrico. Esses experimentos eram feitos em ambiente médico controlado com monitoramento das ondas cerebrais via eletroencefalograma (EEG) e estimulação com luzes estroboscópicas. Grof averiguou que, com a ingestão de LSD, os pacientes atingiam outros estados consciências tidos como anormais que ajudavam na melhora de sua saúde mental apresentando compreensões e insights que impactavam positivamente na sua recuperação. Com a proibição do uso de LSD, ele continuou seus estudos sobre estados de consciência desenvolvendo a técnica de Respiração Holotrópica, método de ampliação da consciência que combina respiração, música, trabalho corporal e mandala (Grof; Grof, 1990).


A partir desses estudos, Grof mudou sua perspectiva sobre psicologia e psiquiatria, unindo a elas outros estados de consciência, concebendo uma cartografia holística da consciência. Em 1968, juntamente com Abraham Maslow, Viktor Frankl, Antony Sutich, e James Fadiman, ajudou a fundar a Psicologia Transpessoal, cuja visão de homem é de um ser biológico, psicológico, social e espiritual. A espiritualidade é incluída como característica essencial ao ser humano, a essência que nos faz buscar sentido para a vida, que nos faz almejar transcender, acreditar e buscar o que está além do que podemos perceber através dos cinco sentidos (Maslow, 1968).


A Psicologia Transpessoal vê, portanto, a dimensão espiritual como intrínseca ao desenvolvimento humano e como aspecto inerente a consciência. A despeito da espiritualidade ser um tema de grande interesse, que tem atraído cada vez mais a atenção, existe grande resistência para que a dimensão sagrada do indivíduo seja considerada parte integrante da existência humana. Grof esclarece (Grof, 2007):

“As descrições das dimensões sagradas da realidade e a ênfase sobre a vida espiritual estão em conflito com o sistema de crenças que domina o mundo industrial. De acordo com a ciência acadêmica ocidental dominante, só a matéria existe realmente. A vida, a consciência e a inteligência são mais ou menos acidentais.”


Baseado nas pesquisas de Grof e outros autores, Kenneth Ring ampliou as denominações das vivências do inconsciente e elaborou uma cartografia da consciência, relacionando os diferentes conteúdos experienciais a uma ou mais regiões. Sabe-se que esses conteúdos se interpenetram mutuamente e não estão, de forma alguma, separados um do outro (Saldanha, 2008):


· Vigília - conteúdos usuais do cotidiano presentes na consciência;

· Pré-consciente - conteúdos facilmente acessados parcialmente ligados à vigília;

· Inconsciente Psicodinâmico - ou inconsciente Freudiano, experiências desde o nascimento até o momento de vida atual;

· Inconsciente Ontogenético - vivências intrauterinas incluindo experiências de morte e nascimento;

· Inconsciente Transindividual - experiências ancestrais, coletivas e arquetípicas;

· Inconsciente Filogenético - experiências além das formas humanas tanto orgânicas, como inorgânicas;

· Inconsciente Extraterreno - consciência para além do planeta, experiência de estar fora do corpo, percepção extra-sensorial, encontro com entidades espirituais e possessão de espíritos;

· Super consciente ou supra consciente - êxtase existencial, percepção ampla da realidade, apreensão intuitiva do fenômeno da unidade e da relação homem-cosmos;

· Vácuo - nirvana, estado de puro Ser, além do tempo-espaço onde a consciência funde-se a mente universal.


Grof ressalta que para abarcar todos esses estados, é imprescindível ampliar a dimensão da psique humana para além do nível biográfico. De acordo com Freud nosso histórico psicológico tem início após nosso nascimento, Grof acrescenta o domínio perinatal devido sua estreita relação com o trauma do nascimento biológico. Esse nível contem as lembranças que o feto viveu nos estágios consecutivos do parto e formam quatro grupos experienciais denominados por Grof de Matrizes Perinatais Básicas (Grof, 2007; 2010; 2012):


MPB I – universo amniótico de união primal com a mãe. Refere-se a lembranças do estado pré-natal avançado, pouco antes do parto. Durante episódios de existência embrionária sem distúrbios, Grof observou que as pessoas podem se sentir em espaços imensos sem fronteiras ou limites

levando a identificação com galáxias, espaço interestelar, cosmos ou com o mar, o oceano e animais aquáticos. Inversamente, as pessoas que revivem episódios de distúrbios intrauterinos ou experiências de “útero mau” podem ter sensação de ameaça sombria, visões de entidades demoníacas ou visões apocalípticas sangrentas do fim do mundo.


MPB II – engolfamento cósmico e sem saída ou inferno. Relacionada ao primeiro estágio do parto, o inicio do nascimento biológico, quando o útero se contrai, mas o colo ainda não se abriu. Tipicamente, os indivíduos sentem que estão sendo sugados para dentro de um

redemoinho ou sendo engolidos por feras míticas, é comum imagens de monstros arquetípicos devoradores e seres mitológicos em situação de dor e desesperança. Pode ocorrer identificação com prisioneiros em calabouços, campos de concentração, hospícios e situações de tortura. Esse estágio é uma das piores experiências que um ser humano pode ter, acarretando sensações de solidão, culpa e desesperança. Grof relaciona esse estado de escuridão e desespero abismal com a Noite Escura da Alma, um estágio de abertura espiritual que, apesar de ser difícil, pode ter um efeito libertador.


MPB III – a luta de morte-renascimento. Refere-se ao esforço para nascer depois que o colo do útero se dilata e acontece a propulsão pelo canal do parto. Experiência de esforço titânico envolvendo pressões e energias ou cenas sangrentas de violência e tortura. As pessoas podem ter imagens sexuais, às vezes, combinada com dor, agressão e medo, podem experimentar situações sadomasoquistas, estupros e situação de abuso sexual. Pode incluir elementos do inconsciente coletivo, figuras de heróis e deidades que representam a morte e renascimento. Temas sobre fogo também são associados a este estágio, podendo ser na forma ordinária e em uma variedade arquetípica de chamas purificadoras que poderiam assumir qualidade purgatória, destruindo tudo o que foi corrompido e preparando o indivíduo para o renascimento espiritual.


MPB IV – a experiência de morte-renascimento. Lembrança da chegada ao mundo, do nascimento em si, a expulsão final através do canal do parto. A experiência de “morrer” e a agonia durante o esforço para renascer refletem a dor e a ameaça vital sentidas durante o processo de nascimento biológico. Grof afirma que nós nascemos anatomicamente, mas não lidamos com este fato emocionalmente e a maneira como experienciamos a nós e ao mundo é impregnada por essa constante lembrança da vulnerabilidade, inadequação e fraqueza que vivemos no nascimento. Ao expurgar velhas programações, deixando-as emergir à consciência, elas se tornam irrelevantes e começam a morrer. Embora esse processo pareça amedrontador, é muito curativo e transformador. Após a experiência de total aniquilação, a pessoa é tomada por visões luminosas, de radiação e de beleza que são consideradas divinas, podendo se sentir inundado por emoções positivas com relação a si mesmo, aos outros, à natureza e à existência em geral.


Grof elucida que o conteúdo dessas matrizes não se limita às lembranças fetais e cada uma delas também representa uma abertura seletiva para as áreas do inconsciente coletivo histórico e arquetípico, que contem temas de qualidade experiencial semelhante. Portanto, além de ter um conteúdo próprio, as MPBs funcionam como princípios organizadores para as experiências de outros níveis do inconsciente (Grof, 2007, Grof 2012).


Outro nível dessa nova cartografia é o transpessoal, significando literalmente “além do pessoal”, onde a consciência transcende os limites corpo / ego e os limites comuns do tempo linear e do espaço tridimensional. Resultando em identificação experiencial com outras pessoas, grupos de pessoas e outras formas de vida e permitindo acesso a lembranças ancestrais, filogenéticas e cármicas (Grof, 2010).


Ao perceber que não existia na psiquiatria e psicologia uma nomenclatura específica diferenciando os estados não ordinários de consciência dos estados “ampliados” ou “expandidos” de consciência, Grof cunhou o nome de estados holotrópicos. De origem grega, holos quer dizer “todo” e trepein “movendo-se em direção a”, significa “voltado para a totalidade” ou “mover-se em direção ao todo” (Grof, 2010).


Para favorecer o acesso a esses estados, Grof criou a técnica da Respiração Holotrópica – uma combinação de respiração acelerada, música evocativa, trabalho corporal e desenhos de mandalas – cujo objetivo é ativar a psique e trazer para a consciência importantes materiais inconscientes tornando-os disponíveis para o trabalho terapêutico. Com essa técnica a pessoa tem acesso a domínios biográficos, perinatais e transpessoais do inconsciente, podendo desta forma transformá-los (Grof, 2010):


“Provavelmente a inovação mais interessante que surgiu a partir do estudo de estados holotrópicos seja a substituição das abordagens verbais por abordagens experienciais de auto exploração e psicoterapia, e a utilização da inteligência inata de cura da psique do próprio paciente em vez do terapeuta ou facilitador assumir o papel de orientador.”


Durante mais de 60 anos de trabalho e pesquisa, Grof constatou que apesar do crescimento e desenvolvimento espiritual ser uma característica inata aos seres humanos, esse processo pode se apresentar em forma de uma crise psicoespiritual. Para falar sobre essas experiências, Grof criou o termo de Emergência Espiritual referindo-se à evolução de uma pessoa para um modo de ser mais maduro, com maior liberdade de escolha pessoal e uma sensação de ligação profunda com as outras pessoas, com a natureza e com o cosmos. Se a experiência de emergência espiritual de uma pessoa for muito rápida e dramática, esse processo natural pode se tornar uma crise, apresentar sintomas psicóticos e ser confundido com um transtorno mental (Grof; Grof, 1990):


“O renascimento espiritual é tão normal para a vida humana quanto o nascimento biológico. Como o nascimento, a emergência espiritual tem sido acompanhada há séculos por muitas culturas como parte essencial da vida e, não obstante, tornou-se conhecida como uma doença na sociedade moderna. As experiências que ocorrem durante esse processo abrangem uma ampla gama de profundidade e intensidade, da mais amena até a mais dominadora e importuna”.


Grof identifica dois quadros: a Crise de Emergência Espiritual (Spiritual Emergency) - sugerindo uma crise, emergência no sentido de “urgência” e a Emergência Espiritual (Spiritual Emergence) - sugerindo uma oportunidade de ascensão a um novo nível de consciência, emergência no sentido de “elevação”. Verificam-se, consequentemente, diferentes padrões experienciais assim como graus de insanidade nessas experiências as quais requerem tratamentos diferenciados sendo o auxilio relativo à natureza, profundidade e intensidade do processo.


Um último aspecto que deve ser mencionado nas pesquisas de Grof diz respeito aos sistemas de experiência condensada – COEX, definidos por ele como memórias de carga emocional, de diferentes períodos de nossas vidas, que se assemelham pela qualidade da emoção ou sensação física que compartilham (Grof, 2007).


Esses sistemas são agregados de memórias, sejam elas traumáticas ou não, que ficam guardadas no inconsciente em forma de complexas constelações dinâmicas, influenciando a forma pela qual percebemos, sentimos e agimos com relação a nós mesmos, ao outro e ao mundo. Essas lembranças podem estar relacionadas a diversas fases da vida pré-natal e pós-natal, mas as raízes mais profundas do sistema COEX se estendem às diversas matrizes transpessoais, sejam elas: ancestrais, cármicas, raciais, filogenéticas e arquetípicas. Durante um estado holotrópico de consciência, o sistema COEX ativado determina o conteúdo da experiência, o qual pode ser trabalhado levando a uma mudança de um COEX negativo formado por lembranças traumáticas para um positivo associadas a lembranças de emoções agradáveis. (Grof, 2010).


Conclusão

Grof reconhece que as experiências transpessoais possuem muitas características estranhas que abalam os pressupostos metafísicos fundamentais do paradigma newtoniano-cartesiano e da visão do mundo científico materialista. Completa dizendo que somente pesquisadores, que estudaram e / ou experienciaram pessoalmente esses fenômenos fascinantes, compreendem que as tentativas da ciência tradicional de rejeitá-los como sendo produtos irrelevantes da fantasia e da imaginação humana ou alucinações são ingênuas e inadequadas. E conclui afirmando que (Grof 2010):


“Para levarmos em conta todos os fenômenos apresentados nesses estados, devemos reavaliar radicalmente nossa compreensão das dimensões da psique humana.”


Referências:

Grof, C.; Grof, S. Emergência Espiritual: Crise e Transformação Espiritual. São Paulo, Editora Cultrix, 1989.

________ A Tempestuosa Busca do Ser: Um Guia para o Crescimento Pessoal através da Crise de Transformação. São Paulo, Editora Cultrix, 1990.

Grof, S. Psicologia do Futuro: Lições das Pesquisas Modernas de Consciência. Brasil, Heresis Transpessoal, 2007.

Grof, C.; Grof, S. Respiração Holotrópica: Uma nova abordagem de Auto Exploração e Terapia. Rio de Janeiro, Capivara editora, 2010.

Grof, S. Cura Profunda: A perspectiva Holotrópica. Rio de Janeiro, Capivara editora, 2012.

Maslow, A. H. Toward a Psychology of Being. Nova York: Van Nostrand Company, 1968.

Saldanha, V. Psicologia Transpessoal: Abordagem Integrativa – Um Conhecimento Emergente em Psicologia da Consciência. Ijuí, Rio Grande do Sul, Editora Unijuí, 2008.

Tabone, M. A Psicologia Transpessoal: Introdução à nova visão da Consciência em Psicologia e Educação. São Paulo, Editora Cultrix, 1998.
Fonte:https://www.iluminarpsicologia.com/single-post/o-modelo-da-cartografia-da-consci%C3%AAncia-de-stanislav-grof

Walsh, R., Vaughn, F. Caminhos Além Do Ego: Uma Visão Transpessoal. São Paulo, Editora Cultrix, 1993.nossas vidas, que se assemelham pela qualidade da emoção ou sensação física que compartilham (Grof, 2007).

Esses sistemas são agregados de memórias, sejam elas traumáticas ou não, que ficam guardadas no inconsciente em forma de complexas constelações dinâmicas, influenciando a forma pela qual percebemos, sentimos e agimos com relação a nós mesmos, ao outro e ao mundo. Essas lembranças podem estar relacionadas a diversas fases da vida pré-natal e pós-natal, mas as raízes mais profundas do sistema COEX se estendem às diversas matrizes transpessoais, sejam elas: ancestrais, cármicas, raciais, filogenéticas e arquetípicas. Durante um estado holotrópico de consciência, o sistema COEX ativado determina o conteúdo da experiência, o qual pode ser trabalhado levando a uma mudança de um COEX negativo formado por lembranças traumáticas para um positivo associadas a lembranças de emoções agradáveis. (Grof, 2010).


Conclusão

Grof reconhece que as experiências transpessoais possuem muitas características estranhas que abalam os pressupostos metafísicos fundamentais do paradigma newtoniano-cartesiano e da visão do mundo científico materialista. Completa dizendo que somente pesquisadores, que estudaram e / ou experienciaram pessoalmente esses fenômenos fascinantes, compreendem que as tentativas da ciência tradicional de rejeitá-los como sendo produtos irrelevantes da fantasia e da imaginação humana ou alucinações são ingênuas e inadequadas. E conclui afirmando que (Grof 2010):


“Para levarmos em conta todos os fenômenos apresentados nesses estados, devemos reavaliar radicalmente nossa compreensão das dimensões da psique humana.”


Referências:

Grof, C.; Grof, S. Emergência Espiritual: Crise e Transformação Espiritual. São Paulo, Editora Cultrix, 1989.

________ A Tempestuosa Busca do Ser: Um Guia para o Crescimento Pessoal através da Crise de Transformação. São Paulo, Editora Cultrix, 1990.

Grof, S. Psicologia do Futuro: Lições das Pesquisas Modernas de Consciência. Brasil, Heresis Transpessoal, 2007.

Grof, C.; Grof, S. Respiração Holotrópica: Uma nova abordagem de Auto Exploração e Terapia. Rio de Janeiro, Capivara editora, 2010.

Grof, S. Cura Profunda: A perspectiva Holotrópica. Rio de Janeiro, Capivara editora, 2012.

Maslow, A. H. Toward a Psychology of Being. Nova York: Van Nostrand Company, 1968.

Saldanha, V. Psicologia Transpessoal: Abordagem Integrativa – Um Conhecimento Emergente em Psicologia da Consciência. Ijuí, Rio Grande do Sul, Editora Unijuí, 2008.

Tabone, M. A Psicologia Transpessoal: Introdução à nova visão da Consciência em Psicologia e Educação. São Paulo, Editora Cultrix, 1998.

Walsh, R., Vaughn, F. Caminhos Além Do Ego: Uma Visão Transpessoal. São Paulo, Editora Cultrix, 1993.

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