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As estruturas representam um enorme avanço para o estudo do cérebro humano
Criados em laboratório por brasileiros, minicérebros ajudam a entender o cérebro humano
Evanildo da SilveiraDe São Paulo para a BBC News Bras
“Ele não apenas parece com o cérebro em desenvolvimento, mas seus tipos diversos de células expressam quase todos os genes como um cérebro”, afirma Rene Arand, professor de química biológica e farmocologia da Universidade Estadual de Ohio. “Por um longo tempo temos lutado para resolver problemas complexos de doenças cerebrais, que causam dor e sofrimento tremendos. O poder desse modelo cerebral é promissor para a saúde humana porque ele nos dá opções melhores e mais relevantes para desenvolver terapias que [testes em] roedores.”
Eles são bem pequenos, com tamanho médio entre três e cinco milímetros, mas representam um enorme avanço para o estudo do cérebro humano, suas doenças e reações a drogas e medicamentos.
São os minicérebros ou organoides, agregados tridimensionais de neurônios criados em laboratório a partir de células epiteliais (da pele) reprogramadas. Eles reproduzem, em parte, as estruturas, tipos celulares e respostas fisiológicas encontradas no cérebro.
Segundo Lívia Goto, pós-doutoranda do Instituto D'Or de Pesquisa e Ensino (IDOR), da equipe do laboratório Stevens Rehen, pioneiro no desenvolvimento de minicérebros no Brasil, esses organoides apresentam algumas características semelhantes às observadas no cérebro humano em formação, principalmente no que diz respeito à organização das camadas primordiais e aos tipos celulares.
"Nesse sentido, são bons modelos para estudar alguns dos processos fisiológicos, bioquímicos e metabólicos observados no tecido cerebral", diz.
Os minicérebros são feitos a partir de células da pele ou da urina de um voluntário, induzidas em laboratório a voltarem ao estágio de células-tronco, com potencial de se transformarem em qualquer tecido do corpo humano - são, por isso, chamadas células-tronco de pluripotência induzida (iPS). Em seguida, em um líquido com nutrientes semelhantes aos do ambiente de desenvolvimento do embrião humano, são transformadas em neurônios e outras células do sistema nervoso
Rehen, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e pesquisador do IDOR, explica que já existem no mundo organoides de intestino, rins, testículos, pâncreas, pulmão e coração, que são utilizados atualmente em pesquisas biomédicas.
"Dentre todos os desenvolvidos, entretanto, talvez aqueles que aguçam mais a curiosidade sejam os cerebrais", diz. Ele ressalva, no entanto, que eles estão longe de ser um cérebro, porque, entre outros motivos, não têm - pelo menos, por enquanto - consciência, nem pensamentos nem memória. Além disso, têm apenas cinco milhões de neurônios ante os 86 bilhões do ser humano.
De acordo com Rehen, apesar das limitações, os minicérebros são um bom modelo para estudo de tecido humano vivo. "Com eles é possível fazer uma série de descobertas sobre alterações celulares e moleculares do tecido cerebral exposto, por exemplo, a agentes causadores de doenças", explica.
"Mas não só isso. Os organoides cerebrais também servem para entendermos quais são as respostas dos neurônios a medicamentos ou a substâncias que podem vir a se tornar um novo remédio, como é o caso dos psicodélicos."
Estudos com minicérebros geraram resultados concretos
Isso não é apenas teoria. Rehen já tem resultados concretos nessas áreas. Num trabalho realizado em 2016 no IDOR, em parceria com a UFRJ e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), ele e sua equipe identificaram a relação entre o vírus Zika e microcefalia.
"Em laboratório, infectamos organoides cerebrais com o vírus e observamos que ele matava, em uma semana, as células neurais, comprometendo o correto desenvolvimento do cérebro", conta.
De acordo com ele, esse flavivírus, originário da África, causa lesões no DNA, o que faz com que as células parem de se multiplicar e morram, comprometendo a formação do cérebro.
Os organoides foram úteis ainda para a identificação de dois medicamentos que poderão ser eventualmente utilizados por mulheres grávidas, em caso de nova epidemia. O trabalho foi publicado na prestigiosa revista Science.
O grupo de Rehen também vem estudando o efeito de substâncias psicodélicas - com potencial de dar origem a novos medicamentos no futuro - sobre neurônios humanos. Apesar de algumas delas serem consumidas há muito tempo, pouco se sabe sobre seus eventuais efeitos terapêuticos.
Um exemplo pesquisado por Rehen é a dimetiltriptamina, presente, em duas formas distintas, no sapo Bufo alvarius e a ayahuasca, chá que altera a consciência, também conhecida como daime ou santo-daime.
"Quase mil proteínas foram alteradas, a maior parte associada à neuroplasticidade, redução de inflamação e de neurodegeneração", conta. "O estudo demonstra o potencial clínico pouco explorado dos psicodélicos na medicina."
Pouco conhecidos do público, organoides tem uma história antiga na ciência
Apesar de serem ainda pouco conhecidos do público em geral, os organoides têm uma história mais antiga do que se poderia imaginar. "As culturas tridimensionais de tecido nervoso têm sido estudadas desde a década de 1950, passando por diversos aprimoramentos a partir de células animais", diz Lívia.
"No Brasil, Fernando Mello e Rafael Linden foram pioneiros na criação de modelos tridimensionais da retina (que é parte do cérebro)."
Rehen, por sua vez, lembra que, em 2008, o japonês Yoshiki Sasai criou em seu país os primeiros organoides que lembravam olhos ou partes do cérebro. "O hiato em virtude de sua morte prematura (suicidou-se ao ver seu nome associado a uma fraude científica) foi preenchido em 2013", diz.
"Na Áustria, Madeline Lancaster e Juergen Knoblich foram pioneiros ao produzir minicérebros humanos mantidos em suspensão."
Ele próprio começou a estudar a formação da retina a partir de estruturas tridimensionais na década de 1990. Nos anos 2000, nos Estados Unidos, Rehen desenvolveu modelos tridimensionais para o estudo do cérebro de camundongos, que ajudaram na descoberta de fatores capazes de influenciar a geração dos giros e sulcos (dobramentos) do cérebro. A partir de 2014, já de volta ao Brasil, adaptou a receita de Lancaster para criar os primeiros minicérebros no país.
De acordo com ele, "esse avatar biológico vivo" tem facilitado bastante as pesquisas sobre a neurogênese normal e associada a enfermidades. "Células-tronco de pacientes com doenças neurodegenerativas ou transtornos mentais podem ser usadas para criar minicérebros, que crescem por meses em laboratório, para estudá-las e melhor entendê-las", explica.
Hoje já há vários resultados concretos mundo afora. Rehen conta que nos Estados Unidos, por exemplo, utilizando organoides cerebrais, Flora Vaccarino revelou um desbalanço neuroquímico associado ao autismo e "Kristen Brennand descobriu alterações num receptor celular que facilitará a identificação de medicamentos para a esquizofrenia".
Além disso, Fred Gage transplantou minicérebros para o interior do sistema nervoso de roedores. "O objetivo era fazer com que vasos sanguíneos do animal nutrissem o tecido humano", explica Rehen. "Ele observou que houve troca de informação entre organoide e cérebro."
Ele explica que os minicérebros não se desenvolvem da mesma forma que o nosso órgão maior. E tampouco possuem consciência.
"Mas já é possível mantê-los vivos por mais de nove meses, período que coincide com o tempo de uma gestação humana", diz. "Paola Arlotta, de Harvard, por exemplo, gerou organoides cerebrais sensíveis a luz, algo que poderá - no futuro - permitir a comunicação entre eles e os cientistas."
Fonte:https://www.bbc.com/portuguese/geral-45265214
Cientistas criam cérebro em laboratório
Órgão desenvolvido artificialmente é equivalente ao de um feto de cinco semanas
Por Fábio Marton
Um grupo da Universidade Estadual do Ohio (EUA) acaba de apresentar sua, como diria certo famoso doutor fictício, criação. Um pequeno projeto de cérebro, do tamanho de uma borracha, desenvolvido a partir de células-tronco tiradas da pele de um adulto. Ele possui organelas identificáveis, como o princípio do nervo óptico, o hemisfério cerebral e a dobra cefálica, todas características de um cérebro embrionário humano de cinco semanas. Mas não é perfeito: os cientistas ainda não conseguiram introduzir nele o sistema circulatório.
Fizemos piada e pode até parecer começo de filme de terror, mas, na verdade, a pesquisa é do bem. Os cientistas criaram esse modelo para testar, palavras deles, de forma “ética”, drogas experimentais e doenças neurológicas. A razão para a criação, que levou quatro anos, se deve ao fato de o cérebro de ratos de laboratório não ser sempre um modelo ideal para testar problemas humanos. O pequeno cérebro artificial é um modelo ideal para isso. E se você está preocupado: não, ele não pensa – as estruturas responsáveis pela consciência só surgem entre a 24ª e 28ª semana de gestação. Um órgão artificial só é vivo no sentido de que células de pessoas mortas há décadas podem ser vivas – sim, isso existe.
Já faz alguns anos que cientistas têm criado órgãos humanos cultivados do “zero”, a partir de células – e, desde então, órgãos simples, como dentes, bexigas ou traqueias, vêm sendo implantados em pacientes, ainda de forma experimental. Mas esta é a primeira vez que um cérebro, o órgão mais complexo e ainda envolto em mistérios, é desenvolvido tão convincentemente.
Em matéria de notícias de ficção científica, esta semana está rendendo. E, para quem está com saudades da paranoia, vale saber que entre os patrocinadores da pesquisa está a DARPA, a agência de pesquisa do exército americano. O propósito (oficialmente) é exatamente o que os cientistas disseram, testar novas drogas. No caso, para ajudar soldados com transtorno de estresse pós-traumático.
Fonte:
Brain-in-a-dish as mature as five-week-old fetus brain, Ohio State University via ScienceDaily
Fonte:https://super.abril.com.br/saude/cientistas-criam-cerebro-em-laboratorio/
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