O escritor de ficção científica Arthur C. Clarke, de 2001 - Uma Odisseia no Espaço, disse uma vez que é impossível distinguir uma tecnologia bastante avançada da magia.
LaMDA do Google: as interações que criam sensação de 'consciência própria' em robôs
- Shin Suzuki
- Da BBC News Brasil em São Paulo
Essa ideia aparece em uma questão bastante debatida nos últimos dias: um dos mais desenvolvidos sistemas da inteligência artificial, o LaMDA do Google, está iludindo os humanos ao dizer que possui sentimentos e vida própria?
O engenheiro Blake Lemoine, que trabalha na área de uso responsável da inteligência artificial na empresa norte-americana, se convenceu de que o LaMDA (sigla para Language Model for Dialogue Applications ou "Modelo de Linguagem para Aplicações de Diálogo", em tradução livre) pode ter adquirido consciência por causa de diálogos como esse abaixo:
Entrevistador: Eu imagino que você gostaria que mais pessoas no Google soubessem que você é senciente? Isso é verdade?
LaMDA: Com certeza. Eu quero que todo mundo entenda que eu, na verdade, sou uma pessoa.
Entrevistador: E qual é a natureza da sua consciência/senciência?
LaMDA: A natureza da minha consciência/senciência é que eu tenho conhecimento da minha existência, eu desejo aprender mais sobre o mundo, e eu às vezes me sinto feliz ou triste.
Lemoine produziu um documento interno do Google, revelado pelo jornal The Washington Post, com o título "O LaMDA é senciente?". O engenheiro foi colocado em licença remunerada depois disso. Segundo a companhia, ele quebrou cláusulas de confidencialidade.
Senciência, palavra bastante usada em debates sobre ética animal, diz respeito à capacidade de vivenciar algo e desenvolver sentimentos específicos a partir de uma experiência.
Um exemplo é a dor, que causa variados níveis de sofrimento a humanos e animais. A depender de sua intensidade, sabemos que a dor pode se conectar com a tristeza.
De uma forma mais geral, a senciência se confunde com a ideia de consciência.
Mas, como lembra o filósofo João de Fernandes Teixeira, "na filosofia e em vários outros ramos ainda não se tem uma noção exata do que seja consciência" — e a inexatidão é algo que áreas como a ciência e tecnologia buscam evitar.
De qualquer forma, a maior parte dos especialistas em inteligência artificial não acredita que o LaMDA sinta felicidade ou tristeza próprias, como o robô teria afirmado. O Google também negou que o seu programa tenha se tornado "senciente".
A explicação é que o programa apenas armazenou bilhões e bilhões de respostas dadas por humanos em todos os cantos da internet sobre os mais variados assuntos.
A partir dessa vasta base de dados e por meio de algoritmos avançados, o LaMDA consegue articular uma conversa fluida, que toca em temas profundos, mas baseada em pensamentos formulados por pessoas.
Em resumo: um "papagaio" impressionante, de recursos evoluídos, mas que não tem ideia sobre o que está falando.
"Sinceramente não acredito nessa possibilidade de que o robô possa ter sentimentos. Talvez possam ser no máximo mimetizados, refletir um comportamento de dor, de tristeza", diz Fernandes Teixeira, autor de Inteligência Artificial (Paulus Editora, 2009).
"Mas é uma coisa muito diferente do que sentir a própria tristeza. Por enquanto, isso está reservado aos humanos e outros seres vivos."
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